sábado, 3 de março de 2012

Quando eu quero ser mau

A melhor qualidade que um ser humano pode ter é a bondade. Kant não concordaria. Do alto de sua capacidade filosófica germânica, ele não considerava a bondade predicado. Por uma razão irredutível: por ser inata. Quer dizer: a pessoa nasce com aquilo, não se esforça para sê-lo. Como a beleza física – não existe nenhum mérito nela, a não ser uma harmônica combinação de genes.

Mas, embora não haja méritos, não há nada de errado em admirar quem foi dotado com uma boa aparência ou com um bom coração. O mundo é um lugar melhor para se viver quando andam sobre sua superfície uma Megan Fox ou um Gandhi.

Só que a beleza não cansa, mesmo quando surge em excesso, como a de Catherine Deneuve em horário nobre. Bondade, sim. Bondade demais cansa.

Digo isso porque tenho uns dois amigos, não mais do que dois, que são tão bonzinhos que despertam em mim o que tenho de pior. Aquela bondade melequenta me irrita. Quero ser mau quando estou com eles e, o mais grave, transformo-me, realmente, em uma pessoa má. Vejo malícia em tudo, enxergo todos pelo lado ruim, sou crítico e amargo, sou agressivo, sou veemente, sou como alguns comentaristas de blog.

Como pode a bondade pura gerar sentimentos ruins?

Aí está. Entendo o motivo. Ainda que Jesus tenha garantido que os mansos herdarão a Terra, a mansidão não é uma qualidade apreciada pela maioria das pessoas. Porque a mansidão parece frouxidão, e as pessoas não gostam de quem é frouxo. As pessoas gostam de quem é bom, sim, mas desde que a bondade seja atuante, decidida e positiva, jamais passiva. A bondade tem de saber ver a maldade onde a maldade existe.

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David Coimbra
Zero Hora 28/02/2012

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