quarta-feira, 30 de maio de 2012

Cores

Eu sou branco. Você é vermelho.

Quando estamos juntos somos rosa.
Antes de eu conhecer você, eu não sabia o que era rosa.
Até que eu vivia bem sozinho: comia o que e na hora que eu queria; saía na hora quando bem entendia para ir ao lugar que tinha vontade de ir,numa liberdade, independência e auto-suficiência.
Quando eu vi você, fiquei vermelho de paixão e nem me incomodei com os meus brancos.
Até perceber-me que eu já não era mais o branco.
Foi quando o vermelho começou a me sufocar e então, brancamente, me protegi.
Mas às vezes eu me irritava e brigava com você.
No fundo, era porque você era vermelha e não branca igualzinho a mim.
Percebi-me em alguns variados momentos querendo mudar a sua cor.
Ainda bem que você soube permanecer-se vermelha,
ter suas próprias emoções, sentimentos, comportamentos e pontos de vista.
Caso contrário, você seria também branca.
Mas tive minhas reticências, pois estava acostumado ao meu ritmo e modo de vida branco.
Temi perder minha individualidade.
Mas aos poucos fui descobrindo que o branco para se transformar em rosa
não é perder, desestruturar-se e desaparecer, mas é completar-se com o vermelho.
O rosa me atemorizou, mas hoje vejo quanto é gostoso conviver, relacionar-me, amar e ser amada.
Dá mais trabalho porque nem tudo pode e deve ser feito brancamente, mas sem dúvida tudo pode ser mais gostoso e rico com o vermelho.
Freqüentemente, um bom lanche branco não é tão agradável quanto um singelo jantar rosa.
Um mundo muito Cor de Rosa a todos....

Içami Tiba

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Acreditar


Só há uma forma de se estar perto
quando se está muito longe:
se fecha os olhos, bem forte,
e pensa e deseja muito, muito, muito
estar juntinho de quem ama.

Porque no amor tem dessas coisas
a gente só não pode abrir os olhos
a gente só não pode deixar de acreditar .

Cáh Morandi

quinta-feira, 24 de maio de 2012

O seu santo nome

Não facilite com a palavra amor.

Não a jogue no espaço, bolha de sabão.

Não se inebrie com o seu engalanado som.

Não a empregue sem razão acima de toda razão (e é raro).

Não brinque, não experimente, não cometa a loucura sem remissão

de espalhar aos quatro ventos do mundo essa palavra

que é toda sigilo e nudez, perfeição e exílio na Terra.

Não a pronuncie.

Carlos Drummond de Andrade





sábado, 19 de maio de 2012

O contrário do amor



O contrário de bonito é feio, de rico é pobre, de preto é branco, isso se aprende antes de entrar na escola. Se você fizer uma enquete entre as crianças, ouvirá também que o contrário do amor é o ódio. Elas estão erradas. Faça uma enquete entre adultos e descubra a resposta certa: o contrário do amor não é o ódio, é a indiferença.



O que seria preferível, que a pessoa que você ama passasse a lhe odiar, ou que lhe fosse totalmente indiferente? Que perdesse o sono imaginando maneiras de fazer você se dar mal ou que dormisse feito um anjo a noite inteira, esquecido por completo da sua existência? O ódio é também uma maneira de se estar com alguém. Já a indiferença não aceita declarações ou reclamações: seu nome não consta mais do cadastro.


Para odiar alguém, precisamos reconhecer que esse alguém existe e que nos provoca sensações, por piores que sejam. Para odiar alguém, precisamos de um coração, ainda que frio, e raciocínio, ainda que doente. Para odiar alguém gastamos energia, neurônios e tempo. Odiar nos dá fios brancos no cabelo, rugas pela face e angústia no peito. Para odiar, necessitamos do objeto do ódio, necessitamos dele nem que seja para dedicar-lhe nosso rancor, nossa ira, nossa pouca sabedoria para entendê-lo e pouco humor para aturá-lo. O ódio, se tivesse uma cor, seria vermelho, tal qual a cor do amor.

Já para sermos indiferentes a alguém, precisamos do quê? De coisa alguma. A pessoa em questão pode saltar de bung-jump, assistir aula de fraque, ganhar um Oscar ou uma prisão perpétua, estamos nem aí. Não julgamos seus atos, não observamos seus modos, não testemunhamos sua existência. Ela não nos exige olhos, boca, coração, cérebro: nosso corpo ignora sua presença, e muito menos se dá conta de sua ausência. Não temos o número do telefone das pessoas para quem não ligamos. A indiferença, se tivesse uma cor, seria cor da água, cor do ar, cor de nada.


Uma criança nunca experimentou essa sensação: ou ela é muito amada, ou criticada pelo que apronta. Uma criança está sempre em uma das pontas da gangorra, adoração ou queixas, mas nunca é ignorada. Só bem mais tarde, quando necessitar de uma atenção que não seja materna ou paterna, é que descobrirá que o amor e o ódio habitam o mesmo universo, enquanto que a indiferença é um exílio no deserto.

Martha Medeiros

Negra

A negra para tudo


a negra para todos


a negra para capinar plantar


regar


colher carregar empilhar no paiol


ensacar

lavar passar remendar costurar cozinhar

rachar lenha

limpar a bunda dos nhozinhos

trepar.






A negra para tudo

nada que não seja tudo tudo tudo

até o minuto de

(único trabalho para seu proveito exclusivo)

morrer.



Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Felicidade


Seremos todos infelizes
enquanto não descobrirmos
que a nossa felicidade depende
da dos demais.



Pe. Luiz Carlos

domingo, 13 de maio de 2012

Pedrinhas


Reter na mente coisas desagradáveis é como andar


com pedrinhas dentro do sapato:

enquanto você estiver caminhando pela estrada da vida,


elas o machucarão e o atormentarão.

Por que não jogar fora essas pedrinhas,

que estão no sapato da sua mente?

Masaharu Taniguchi

sábado, 12 de maio de 2012

Problemas


Os problemas nunca vão desaparecer,
mesmo na mais bela existência.

Problemas existem para serem resolvidos,
e não para perturbar-nos.

A maior represália contra um inimigo
é perdoá-lo.


Se o perdoamos,
ele morre como inimigo
e renasce a nossa paz.


O perdão nutre a tolerância e a sabedoria .


 Augusto Cury

quinta-feira, 10 de maio de 2012

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Deus triste

Deus é triste.

Domingo descobri que Deus é triste
pela semana afora e além do tempo.

A solidão de Deus é incomparável.

Deus não está diante de Deus.

Está sempre em si mesmo e cobre tudo
tristinfinitamente.

A tristeza de Deus é como Deus: eterna.


Deus criou triste.

Outra fonte não tem a tristeza do homem.


Carlos Drummond Andrade

















sábado, 5 de maio de 2012

Rouxinol

Guardava o rouxinol numa caixinha.
Tudo o que queria
era andar com o rouxinol
empoleirado no dedo.
Mas,
se abrisse a caixinha,
ah! certamente fugiria.
Então amorosamente cortou o dedo.
E,
através de uma mínima fresta,
o enfiou na caixinha."

Marina Colasanti

quarta-feira, 2 de maio de 2012




Não faço poemas como quem chora,


nem faço versos como quem morre.

Quem teve esse gosto foi o bardo Bandeira

quando muito moço; achava que tinha


os dias contados pela tísica


e até se acanhava de namorar.






Faço poemas como quem faz amor.


É a mesma luta suave e desvairada


enquanto a rosa orvalhada


se vai entreabrindo devagar.


A gente nem se dá conta, até acha bom,


o imenso trabalho que amor dá para fazer.






Perdão, amor não se faz.


Quando muito, se desfaz.


Fazer amor é um dizer


(a metáfora é falaz)


de quem pretende vestir


com roupa austera a beleza


do corpo da primavera.


O verbo exato é foder.


A palavra fica nua


para todo mundo ver


o corpo amante cantando


a glória do seu poder




Thiago de Mello