segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Reflexões



E se

E se o oceano incendiar
E se cair neve no sertão
E se o urubu cocorocar
E se o botafogo for campeão
E se o meu dinheiro não faltar
E se o delegado for gentil
E se tiver bife no jantar
E se o carnaval cair em abril
E se o telefone funcionar
E se o pantanal virar pirão
E se o Pão-de-açucar desmanchar
E se tiver sopa pro peão
E se o oceano incendiar
E se o Arapiraca for campeão
E se à meia-noite o sol raiar
E se o meu país for um jardim
E se eu convidá-la pra dançar
E se ela ficar assim assim
E se eu lhe entregar meu coração
E meu coração for um quindim
E se o meu amor gostar então
De mim


Francis Hime/Chico Buarque

sábado, 28 de novembro de 2009

Tempo


O relógio e o espelho


Até o máximo possível e permitido, nunca se deve dar relógio de presente para crianças. O primeiro passo para a aflição do homem é o relógio. A criança é feliz porque não tem noção das horas, do compromisso, do dever com hora marcada.

Nunca vi em minha vida uma criança acordar-se e ver que horas são. Este é o reflexo imediato de qualquer adulto. Depois do sono reparador, do desligamento da vida, retornamos às nossas preocupações.

O sono é o céu do vazio, do nirvana, o relógio traz-nos de volta ao inferno das obrigações.

Consulte seu passado, o tempo mais feliz de sua vida foi aquele em que não usava relógio, indiscutivelmente.

O relógio é o instrumento que mede a vida e dá-nos a consciência da morte, a pior desgraça dos humanos. Os animais são felizes porque não sabem que terão de

pagar o preço da morte. O homem começa a ter noção de que sua vida terá um fim quando põe pela primeira vez um relógio no pulso, ignorando que aquela é a algema que o amarra ao tempo, portanto à finitude.

Eu nunca daria de presente um relógio a uma criança. Gostaria que ela permanecesse indiferente e imune aos prazos, solta, que não tivesse nem noção do dia e da noite, apenas fosse dormir e despertasse quando tivesse sono ou dele se saciasse.

Ter hora para dormir, para acordar-se, para trabalhar, para comparecer à audiência ou ao encontro, estas horas fatais todas é que vão destruindo as pessoas e aproximando-as da morte, senão pelo fato, mas pela perspectiva.

O paraíso de Adão e Eva dá-se exatamente porque não havia lá um relógio, nem o casal primevo conhecia quem o antecedera, o que significaria a morte.

Os tempos da infância e da juventude são os mais felizes pela inconsciência da morte. Até quando fiz 40 anos, eu pensava que era imortal. E essa é a sensação de todos os jovens.

O jovem sabe que vai morrer, mas está tão distante da morte, que consegue ignorá-la, ela não passa de uma utopia diante da vida estuante que se oferece à sua frente. Tem mais é que pensar na vida, o prazo da morte desaparece em meio à delícia existencial.

Não há instante mais crucial da vida que aquele em que o homem se olha no espelho e vê que não é mais aquele. O primeiro inimigo do homem é o relógio, o segundo é o espelho.

Reparem que as crianças nunca se olham no espelho, a não ser quando cobiçam idiotamente tornaremse adultas. Já o adulto olha-se no espelho sempre com um pé atrás, sabendo que seu aspecto só pode retroceder.

O homem que olha para o relógio ou para o espelho está sendo aos poucos aniquilado pela maior adversária do homem, que é a pressa.

Não conheço pessoa madura que não seja escrava prestativa do relógio ou do espelho, instrumentos da sua agonia.

Nunca dê um relógio ou um espelho para uma criança. Ela só é feliz porque estes dois objetos sãolhe absolutamente dispensáveis.


Crônica publicada em 5 de dezembro de 1999 ZH

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Plaravas ???


As plaravas

Rceebi uma megnseam cruisoa com a inrfoãmaço de que uma usinidavdere ienslga fez uma pqesusia e dreobiscu que, praa a letirua, não inrestesa a odrem em que as lrteas de uma plravaa etãso, "a úncia csioa iprotmatne é que a piremria e a útmlia lrtea etejasm no lgaur crteo". Não me pentruge pouqre. Ahco mituo eqsuitsio, mas a vdaerde é que fciunona. E se fcionuna em iglêns e pugortêus, dvee fiouncnar até em hgarúno, "a úicna lgínua que o dabio reeispta".


Gotsei da noíctia e rsloevi erevscer um ranomce iteinro com essa nvoa otorafgria. Psenei na iédia de um prseoagnem dsléixcio, dodato de uma ingêteclinia etraoxrdnáiira, ctanondo a hóistria na preiimra pssoea. A dsleiixa é uma dfunçisão metanl que faz com que o sueitjo, etnre otuars coaiss, eambrahle as ltreas de uma plavara. O que não o imedpe de dnveseovelr hilabdadies epesaciis. Tom Cuirse, por emxelpo, é dléixciso e tnooru-se um dos maoreis arosts de Hywoollod de tdoos os tpemos.


Meu raomnce treia uma luingaegm prórpia, com essa oratogrfia eastrhna, e nesitacesria um ctero esrfoço praa ser apacomhnado. As alçõteraes em cada sqüeiênca de lraets, segriauim uma liógca picartular ciarda pelo pronistotaga, com um cdigóo seetcro emdbutio no seu porsceso de elaçaborão. Um tpio de critopfigraa que, desdanveda, revilaera sreoegds de eastdo. Mias tdare, qanduo a hóriista fsose aptdaada praa o cemina, Tom Ciusre prodeia fzear o ppeal pciprinal. Ddese que acsitaese o cchaê.


As pvralaas são cmoo os fmiles. A gtene lebrma do cmeoço, do hpapy end e é caapz de ctaonr a htórisia tdoa, mmeso que não coignsa dcreveser exentatame a sqüncieêa de coters, o endeacamnteo em que faorm modantas as ceans.


A vdia de tdoo mduno tabémm é aissm. Qnduao a gtene nscae, aguélm dá um gitro de agleria. No fim, esvecrem uma fasre bionta nmua lidápe deizndo que fooms baancas e dxameios sdaaude. E rigeastrm as daats: nimasntceo e mrtoe. O que vieo no mieo dsiso foi um mtone de csaois muistdraas, baos e riuns, e nguéinm lebrma mias deitiro em que oderm eals faorm apacenredo. Ou sjea, não itmpora msmeo.


Pblao Nuerda dziia que "eevscrer é siplmes, coçmea com uma maúsciula, tinerma com um ptono e no mieo vcoê coocla as iéidas". É uma blea fsrae que coirmnfa essa tieora. O que iesntersa é cmoo a csoia ceçoma e cmoo trmiena.


Dsdee que, é calro, vcoê tnhea aumlga iédia intsanereste praa colaocr etrne a maslciúua e o potno fianl.


Kledir Ramil

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Jardim


A MENINA E O JARDIM

Angelina tinha um sonho
Ter um jardim pra brincar
Pois seu mundo era tristonho
Era sem cor o lugar.

Morava numa cidade
Onde ninguém conhecia
O sentimento bondade
A paz, lá não existia.

Um dia um missil caiu
Sobre sua feia casa
E em seu corpinho surgiu
Um par de bonitas asas.

Ela voou para o ceu
Com ela um querubim
De voz doce como mel
E a levou pra seu jardim.

Com a oração de Angelina
O bom Jesus diz amem!
Olhando a linda menina
Vinda de Jerusalem.

Hull de La Fuente

Pérolas


PÉROLAS DE SENTIMENTOS

Com tua flor predileta
Com a gentil palavra discreta
Reuni todos os elogios
Uni-os em vários fios


Fiz destas pérolas, um colar
Para melhor poder te falar
E em todo mar ressoa
A galhardia da tua pessoa

Assim como o oceâno infinito
Teu coração tão bonito
Atrai, encanta e prende


Peguei carona nos ventos
São portadores destes sentimentos
Que a toda alma se rende.

Versa Linden em 23/11/2009

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

O culpado

Eu me declaro culpado de não ter
feito, com estas mãos que me deram,
uma vassoura.

Por que não fiz uma vassoura?
Por que me deram mãos?
Para que me serviram
se só vi o rumor do cereal,
se só tive ouvidos para o vento
e não recolhi o fio
da vassoura,
verde ainda na terra
e não pus para secar os talos ternos
e não os pude unir
num feixe áureo
e não juntei um caniço de madeira
à saia amarela
até dar uma vassoura aos caminhos?

Assim foi!
Não sei como
me passou a vida
sem aprender, sem ver,
sem recolher e unir
os elementos.

Nesta hora não nego
que tive tempo,
tempo,
mas não tive mãos,
e assim, como podia
aspirar com razão à grandeza
se nunca fui capaz
de fazer
uma vassoura
uma só,
uma?

Pablo Neruda

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Literatura


Quem são os leitores no Brasil ?

Na última pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, 95,6 milhões (55% da população estudada) declararam ter lido pelo menos 1 livro nos últimos 3 meses (outros 6 milhões leram em meses anteriores e não foram computados).
Dentre esses, 47,4 milhões (50%) dos leitores são estudantes que leem livros indicados pelas escolas (inclusive didáticos). Do soutros 41,1 milhões que não são estudantes:

- 7,3 milhões (9%) têm até a 4ª série do Ensino Fundamental.
- 10,6 milhões (27%) têm de 5ª a 8ª série do Ensino Fundamental.
- 14,9 milhões (37%) têm Ensino Médio.
- 8,5 milhões (55%) têm Ensino Superior.

- 1/3 dos leitores afirma ler frequentemente.
- 55% são mulheres.
Mulheres leem mais que homens em todos os gêneros, exceto em História, Política e Ciências Sociais.
- 6,9 milhões (7%) dos leitores estavam lendo a Bíblia.

Ensinamento


Ensinamento

Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.

A coisa mais fina do mundo é o sentimento.

Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
"Coitado, até essa hora no serviço pesado".
Arrumou pão e café, deixou tacho no fogo com água quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.

Adelia Prado

Aninha


Aninha e suas pedras

Não te deixes destruir…
Ajuntando novas pedras
e construindo novos poemas.


Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces.

Recomeça.


Faz de tua vida mesquinha
um poema.
E viverás no coração dos jovens
e na memória das gerações que hão de vir.


Esta fonte é para uso de todos os sedentos.
Toma a tua parte.


Vem a estas páginas
E não entraves seu uso
aos que têm sede.


Cora Coralina

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

O permanente e o provisório


O Permanente e o Provisório


O casamento é permanente, o namoro é provisório.
O amor é permanente, a paixão é provisória.
Uma profissão é permanente, um emprego é provisório.
Um endereço é permanente, uma estada é provisória.
A arte é permanente, a tendência é provisória.
De acordo? Nem eu.

Um casamento que dura 20 anos é provisório. Não somos repetições de nós mesmos, a cada instante somos surpreendidos por novos pensamentos que nos chegam através da leitura, do cinema, da meditação. O que eu fui ontem, anteontem, já é memória. Escada vencida degrau por degrau, mas o que eu sou neste momento é o que conta, minhas decisões valem pra agora, hoje é o meu dia, nenhum outro.
Amor permanente... como a gente se agarra nesta ilusão. Pois se nem o amor pela gente mesmo resiste tanto tempo sem umas reavaliações. Por isso nos transformamos, temos sede de aprender, de nos melhorar, de deixar pra trás nossos imensuráveis erros, nossos achaques, nossos preconceitos, tudo o que fizemos achando que era certo e hoje condenamos. O amor se infiltra dentro da nós, mas seguem todos em movimento: você, o amor da sua vida e o que vocês sentem. Tudo pulsando independentemente, e passíveis de se desgarrar um do outro.
Um endereço não é pra sempre, uma profissão pode ser jogada pela janela, a amizade é fortíssima até encontrar uma desilusão ainda mais forte, a arte passa por ciclos, e se tudo isso é soberano e tem valor supremo, é porque hoje acreditamos nisso, hoje somos superiores ao passado e ao futuro, agora é que nossa crença se estabiliza, a necessidade se manifesta, a vontade se impõe – até que o tempo vire.

Faço menos planos e cultivo menos recordações. Não guardo muitos papéis, nem adianto muito o serviço. Movimento-me num espaço cujo tamanho me serve, alcanço seus limites com as mãos, é nele que me instalo e vivo com a integridade possível. Canso menos, me divirto mais, e não perco a fé por constatar o óbvio: tudo é provisório, inclusive nós.

Martha Medeiros

Amar


Monte Castelo

Ainda que eu falasse a língua dos homens.
E falasse a língua do anjos, sem amor eu nada seria.

É só o amor, é só o amor.
Que conhece o que é verdade.
O amor é bom, não quer o mal.
Não sente inveja ou se envaidece.

O amor é o fogo que arde sem se ver.
É ferida que dói e não se sente.
É um contentamento descontente.
É dor que desatina sem doer.

Ainda que eu falasse a língua dos homens.
E falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria.

É um não querer mais que bem querer.
É solitário andar por entre a gente.
É um não contentar-se de contente.
É cuidar que se ganha em se perder.

É um estar-se preso por vontade.
É servir a quem vence, o vencedor.
É um ter com quem nos mata a lealdade.
Tão contrário a si é o mesmo amor.

Estou acordado e todos dormem, todos dormem, todos dormem.
Agora vejo em parte, mas então veremos face a face.

É só o amor, é só o amor.
Que conhece o que é verdade.

Ainda que eu falasse a língua dos homens.
E falasse a língua do anjos, sem amor eu nada seria.


Legião Urbana - Renato Russo

sábado, 21 de novembro de 2009

Sentir


SENTIR PRIMEIRO


Sentir primeiro,
pensar depois
Perdoar primeiro,
julgar depois
Amar primeiro,
educar depois
Esquecer primeiro,
aprender depois
Libertar primeiro,
ensinar depois
Alimentar primeiro,
cantar depois
Possuir primeiro,
contemplar depois
Agir primeiro,
julgar depois
Navegar primeiro,
aportar depois
Viver primeiro,
morrer depois

(Mário Quintana)

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Idades



Três Idades

A vez primeira que te vi,
Era eu menino e tu menina.
Sorrias tanto… Havia em ti
Graça de instinto, airosa e fina.
Eras pequena, eras franzina…




A ver-te, a rir numa gavota,
Meu coração entristeceu
Por que? Relembro, nota a nota,
Essa ária como enterneceu
O meu olhar cheio do teu.



Quando te vi segunda vez,
Já eras moça, e com que encanto
A adolescência em ti se fez!
Flor e botão… Sorrias tanto…
E o teu sorriso foi meu pranto…




Já eras moça… Eu, um menino…
Como contar-te o que passei?
Seguiste alegre o teu destino…
Em pobres versos te chorei
Teu caro nome abençoei.




Vejo-te agora. Oito anos faz,
Oito anos faz que não te via…
Quanta mudança o tempo traz
Em sua atroz monotonia!
Que é do teu riso de alegria?




Foi bem cruel o teu desgosto.
Essa tristeza é que mo diz…
Ele marcou sobre o teu rosto
A imperecível cicatriz:
És triste até quando sorris…



Porém teu vulto conservou
A mesma graça ingênua e fina…
A desventura te afeiçoou
À tua imagem de menina.
E estás delgada, estás franzina…




Manuel Bandeira

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Nêmese

Enem e Nêmese

Os gregos antigos não podiam sequer imaginar um mundo em que os limites não estivessem bem definidos. Para eles, a desmedida e o excesso levavam o indivíduo ou um povo inteiro à ruína e à destruição, e não é por acaso que a literatura e a mitologia grega estejam repletas de personagens que foram implacavelmente punidos por seus delírios de grandeza. Esta preocupação com o autocontrole aparece, por exemplo, no mito de Dédalo, que fabricou um par de asas para que Ícaro, seu filho, pudesse voar. Como pai, e como grego, aconselhou-o a manter-se a meia altura, numa distância prudente tanto do Sol quanto do mar; o jovem, no entanto, embriagado pela nova sensação, tentou subir o mais alto possível: o calor derreteu a cera, as asas se desmancharam no ar e Ícaro encontrou seu fim lá embaixo, na profundeza do oceano.

Imagem: Internet

Para viver feliz, o homem tinha de reconhecer que havia uma ordem natural nas coisas que se sobrepunha ao orgulho dos indivíduos; aqueles que transgrediam esta ordem com sua soberba e arrogância acabavam atraindo sobre si a vingança de Nêmese, a inflexível divindade encarregada de recolocar tudo em seus justos limites. Isso explica a forma que os gregos escolheram para comemorar a vitória sobre os persas em 490 a.C.: convencidos de que nada deteria o seu avanço, os exércitos invasores tinham trazido, com grande dificuldade, um imenso bloco do inconfundível mármore de Paros, com o qual pretendiam erguer um monumento no dia em que a Grécia caísse diante do Império Persa. Na batalha de Maratona, no entanto, foram fragorosamente derrotados pelos atenienses, que aproveitaram o mesmo bloco para que Fídias, o mais famoso escultor de Atenas, fizesse uma grande estátua desta deusa exatamente no lugar em que a louca confiança dos persas tinha finalmente encontrado o seu limite.




Imagem: Internet
Continua ...
( Leia o texto completo em http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a2689811.xml&template=3916.dwt&edition=13351§ion=999 )

Claudio Moreno (Zero Hora 20/10/09)

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Pais e Filhos


É preciso amar as pessoas
Como se não houvesse amanhã
Por que se você parar, pra pensar.
Na verdade não há

Sou uma gota d'água
Sou um grão de areia
Você me diz que seus pais não lhe entendem
Mas você não entende seus pais
Você culpa seus pais por tudo
E isso é absurdo
São crianças como você
O que você vai ser
Quando você crescer?


Renato Russo (Pais e Filhos)

domingo, 8 de novembro de 2009

Para ser feliz



A princípio, bastaria ter saúde, dinheiro e amor, o que já é um pacote louvável, mas nossos desejos são ainda mais complexos.
Não basta que a gente esteja sem febre: queremos, além de saúde, ser magérrimos, sarados, irresistíveis.
Dinheiro? Não basta termos para pagar o aluguel, a comida e o cinema: queremos a piscina olímpica e uma temporada num SPA cinco estrelas.
E quanto ao amor? Ah, o amor... não basta termos alguém com quem podemos conversar, dividir uma pizza e fazer sexo de vez em quando. Isso é pensar pequeno: queremos AMOR, todinho maiúsculo. Queremos estar visceralmente apaixonados, queremos ser surpreendidos por declarações e presentes inesperados, queremos jantar à luz de velas de segunda a domingo, queremos sexo selvagem e diário, queremos ser felizes assim e não de outro jeito.
É o que dá ver tanta televisão.
Simplesmente esquecemos de tentar ser felizes de uma forma mais realista.
Ter um parceiro constante, pode ou não, ser sinônimo de felicidade. Você pode ser feliz solteiro, feliz com uns romances ocasionais, feliz com um parceiro, feliz sem nenhum. Não existe amor minúsculo, principalmente quando se trata de amor-próprio.
Dinheiro é uma benção. Quem tem, precisa aproveitá-lo, gastá-lo, usufruí-lo.
Não perder tempo juntando, juntando, juntando. Apenas o suficiente para se sentir seguro, mas não aprisionado. E se a gente tem pouco, é com este pouco que vai tentar segurar a onda, buscando coisas que saiam de graça,como um pouco de humor, um pouco de fé e um pouco de criatividade.
Ser feliz de uma forma realista é fazer o possível e aceitar o improvável.
Fazer exercícios sem almejar passarelas, trabalhar sem almejar o estrelato, amar sem almejar o eterno. Olhe para o relógio: hora de acordar.
É importante pensar-se ao extremo, buscar lá dentro o que nos mobiliza, instiga e conduz mas sem exigir-se desumanamente.
A vida não é um jogo onde só quem testa seus limites é que leva o prêmio.
Não sejamos vítimas ingênuas desta tal competitividade. Se a meta está demais, reduza-a.
Se você não está de acordo com as regras, demita-se.
Invente seu próprio jogo. Faça o que for necessário para ser feliz. Mas não se esqueça que a
felicidade é um sentimento simples, você pode encontrá-la e deixá-la ir embora por não perceber sua simplicidade. Ela transmite paz, e não sentimentos fortes, que nos atormentam e provocam inquietude no nosso coração.
Isso pode ser alegria, paixão, entusiasmo, mas não felicidade.


Martha Medeiros

sábado, 7 de novembro de 2009

Pinguim

Imagem:Internet
O Pinguim

Bom-dia, Pinguim
Onde vai assim, Com ar apressado?
Eu não sou malvado
Não fique assustado, Com medo de mim.
Eu só gostaria
De dar um tapinha
No seu chapéu de jaca
Ou bem de levinho
Puxar o rabinho
Da sua casaca.

Vinícius De Moraes

São Francisco




São Francisco

Lá vai São Francisco

Pelo caminho

De pé descalço

Tão pobrezinho

Dormindo à noite

Junto ao moinho

Bebendo a água

Do ribeirinho.



Lá vai São Francisco

De pé no chão

Levando nada

No seu surrão

Dizendo ao vento

Bom-dia, amigo

Dizendo ao fogo

Saúde, irmão.



Lá vai São Francisco

Pelo caminho

Levando ao colo

Jesuscristinho

Fazendo festa

No menininho

Contando histórias

Pros passarinhos.


Vinícius De Moraes

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Decisão


"A alegria de amanhã ou o desespero de amanhã tem suas raízes nas decisões que tomamos hoje. Talvez algumas pessoas pensem consigo mesmas: 'eu sei que preciso mudar algumas coisas em minha vida. Talvez mais tarde, mas não agora.'.
Aqueles que ficam de pé no limiar da vida sempre esperando pelo momento certo para mudar são como o homem em pé à beira de um rio esperando que a água passe para que ele consiga atravessar em terra seca.
Hoje é o dia da decisão."


Joseph B. Wirthlin

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Anjos do Mar

Imagem: Silvia
Anjos do Mar
As ondas são anjos que dormem no mar,
Que tremem, palpitam, banhados de luz...
São anjos que dormem, a rir e sonhar
E em leito d’escuma revolvem-se nus!
E quando, de noite, vem pálida a lua
Seus raios incertos tremer, pratear...
E a trança luzente da nuvem flutua...
As ondas são anjos que dormem no mar!
Que dormem, que sonham... e o vento dos céus
Vem tépido, à noite, nos seios beijar!...
São meigos anjinhos, são filhos de Deus,
Que ao fresco se embalam do seio do mar!
E quando nas águas os ventos suspiram,
São puros fervores de ventos e mar...
São beijos que queimam... e as noites deliram
E os pobres anjinhos estão a chorar!
Ai! quando tu sentes dos mares na flor
Os ventos e vagas gemer, palpitar...
Por que não consentes, num beijo de amor,
Que eu diga-te os sonhos dos anjos do mar?

Alvares de Azevedo

Óculos

Imagem: internet
Os óculos escuros


Dizem que os olhos são as janelas da alma. Então, os óculos escuros são as venezianas.

Sempre desconfiei de quem não tira os óculos escuros. Parece que quer esconder dos outros algo que oculta na alma por vergonha.

Se eu não tivesse meu olho esquerdo afetado por antiga paralisia facial, o que impede que suas pálpebras fechem por intuição, só por ato volitivo, nunca usaria óculos escuros. Só os uso para proteger o olho esquerdo do sol ou da luminosidade.

Mas, sempre que alguém se aproxima de mim para conversar, tiro depressa os óculos escuros. Os meus interlocutores não os merecem.

Quem usa óculos escuros esconde uma traição: já feita ou que está por vir.

Por sinal, há três profissões em que são intrínsecos os óculos escuros: cantor de rock ou de pop, segurança de casa noturna e general norte-americano ou brasileiro.

E segurança de casa noturna, além de óculos escuros, usa também indefectível traje inteiramente preto.

Experimente arrancar desses marmanjões possantes os seus óculos escuros. Como Sansão de quem rasparam a cabeleira, ele ficará tonto, sem saber o que fazer, parece que lhe tiraram a força, a energia do utilitário físico que ele representa, enfim, arrancam-lhe a personalidade.

Uma vez perguntei a uma freira por que usava óculos escuros. Ela me disse que para atenuar a visão ofuscante das injustiças do mundo e para lhe parecerem mais sombrios os brilhos que emanam dos rostos dos maus quando eles triunfam diante dos bons.

Outra vez perguntei a um general por que ele usava óculos escuros e ele me respondeu: “Porque não posso suportar o fulgor do meu tenente-coronel diante dos recrutas”.

Os atores da Globo também usam óculos escuros. Os banqueiros de jogo do bicho também usam óculos escuros. Os atores da Globo, deve ser porque lhes ofusca o próprio brilho. Os banqueiros de jogo do bicho, cogito que usam óculos escuros com medo de se encontrarem na rua com apostador a quem calotearam num prêmio ou com um policial honesto, que não pertence à sua lista de suborno.


Mas há profissões e situações que não comportam em nenhuma hipótese óculos escuros.

Caso de um casamento a que assisti esses dias, em que o padre oficiava o sacramento de óculos escuros. Parecia ter vergonha da encrenca em que estava metendo o pobre do noivo.

E juro para vocês que no cemitério São Miguel e Almas, em agosto, estava sendo velado em uma capela um defunto de óculos escuros, eu nunca tinha visto algo igual.

Talvez um parente piedoso do defunto tenha lhe colocado os óculos escuros para livrá-lo do rigor das labaredas do inferno com que ele dali a pouco se defrontaria.


Ocorre-me que só há dois tipos humanos que nunca vi com óculos escuros: os bebês e os hipnotizadores.

E, a uma pessoa que disse a um homem que este parecia um canalha de óculos escuros, o homem respondeu: “Só pareço um canalha? Se você visse meus olhos nuamente, então teria certeza de que eu sou um canalha”.


Paulo Santana

Zero Hora 31/10/09