Em realidade, a criatura humana debate-se em torno de seus dois grandes flagelos: a solidão e a vida em comum. A solidão pode ser para o homem a sua grande vitória ou sua grande frustração.
A solidão não é a vocação do homem, que nasce com a tendência para a vida em comum, embora nasça só. Tanto a solidão é incompatível com o homem, que só as pessoas com pendores singulares, entre elas os sacerdotes e as religiosas, fazem voto de castidade e celibato. Tanto a solidão é uma violência ao homem, que é necessário aos religiosos prometer sob juramento que não vão casar-se. Da mesma forma, a vida em comum tanto se parece com uma adversidade forçada, que nas cerimônias matrimoniais os nubentes são obrigados a jurar perpétua fidelidade.
Quando o homem procura a companhia de um animal para livrar-se da solidão, é quase certo que fará somente bem à sua companhia – e esta a ele. Já quando o homem procura a companhia de outro humano para fugir da solidão, é grande o risco de que faça mal a ele ou dele o receba.
O homem só tenta se livrar da solidão quando sente que já está fazendo má companhia a si próprio. E o homem só tenta se livrar da vida em comum quando percebe que, mesmo acompanhado, retornou à condição aflitiva da solidão. Não há pior aflição do que estar-se na companhia de outrem e sentir-se só, assim como estar-se só sentindo a falta de outrem.
A boa solidão conduz ao céu, a má companhia ao inferno. Assim como a solidão ruim é o pedágio da estrada do inferno, a boa companhia pode ser o passaporte para o céu. É preferível a eloqüência da solidão que o silêncio de uma companhia.
Só sente-se em vida recompensado aquele que, depois de sentir-se só em meio à multidão, sentir-se acalorado pelas multidões quando está recolhido à solidão.
Já não me basta e portanto me enfara a serenidade da solidão, aguça-me a tentação do entusiasmo do companheirismo, apesar de todos os seus riscos.
Ou será que daqui a pouco estarei enojado das incompreensões, ingratidões e deslealdades do companheirismo e estarei querendo me arremessar para o descanso e segurança da solidão, apesar do seu tédio?
A única intranquilidade que me inspira a solidão é a de que eu possa cair sem ter ninguém que me erga e o único horror da vida em comum é que, em caso da minha queda, a minha companhia recuse-se a me erguer ou se mostre inepta para isso.
Atribula-me a solidão tanto quanto a vida gregária, se estou lá, tenho que vir, se estou aqui eu tenho de voltar.
Se quanto maior for o número de pessoas com quem convivemos no tumulto da civilização, maior será o perigo que corremos, parece então que, quanto mais sós estivermos, mais nos sentiremos seguros. Mas de que vale a vida sem riscos da solidão, se uma das maiores tentações da existência é correr riscos? Ou será que o maior risco é o da solidão?
Confesso que me assombra a dúvida: a solidão como refúgio ou a vida em comum como guarida? O ideal talvez fosse saborear fortes doses de solidão na vida em comum ou permitir-se rápidas licenciosidades de convivência como lapsos da solidão.
A solidão não é a vocação do homem, que nasce com a tendência para a vida em comum, embora nasça só. Tanto a solidão é incompatível com o homem, que só as pessoas com pendores singulares, entre elas os sacerdotes e as religiosas, fazem voto de castidade e celibato. Tanto a solidão é uma violência ao homem, que é necessário aos religiosos prometer sob juramento que não vão casar-se. Da mesma forma, a vida em comum tanto se parece com uma adversidade forçada, que nas cerimônias matrimoniais os nubentes são obrigados a jurar perpétua fidelidade.
Quando o homem procura a companhia de um animal para livrar-se da solidão, é quase certo que fará somente bem à sua companhia – e esta a ele. Já quando o homem procura a companhia de outro humano para fugir da solidão, é grande o risco de que faça mal a ele ou dele o receba.
O homem só tenta se livrar da solidão quando sente que já está fazendo má companhia a si próprio. E o homem só tenta se livrar da vida em comum quando percebe que, mesmo acompanhado, retornou à condição aflitiva da solidão. Não há pior aflição do que estar-se na companhia de outrem e sentir-se só, assim como estar-se só sentindo a falta de outrem.
A boa solidão conduz ao céu, a má companhia ao inferno. Assim como a solidão ruim é o pedágio da estrada do inferno, a boa companhia pode ser o passaporte para o céu. É preferível a eloqüência da solidão que o silêncio de uma companhia.
Só sente-se em vida recompensado aquele que, depois de sentir-se só em meio à multidão, sentir-se acalorado pelas multidões quando está recolhido à solidão.
Já não me basta e portanto me enfara a serenidade da solidão, aguça-me a tentação do entusiasmo do companheirismo, apesar de todos os seus riscos.
Ou será que daqui a pouco estarei enojado das incompreensões, ingratidões e deslealdades do companheirismo e estarei querendo me arremessar para o descanso e segurança da solidão, apesar do seu tédio?
A única intranquilidade que me inspira a solidão é a de que eu possa cair sem ter ninguém que me erga e o único horror da vida em comum é que, em caso da minha queda, a minha companhia recuse-se a me erguer ou se mostre inepta para isso.
Atribula-me a solidão tanto quanto a vida gregária, se estou lá, tenho que vir, se estou aqui eu tenho de voltar.
Se quanto maior for o número de pessoas com quem convivemos no tumulto da civilização, maior será o perigo que corremos, parece então que, quanto mais sós estivermos, mais nos sentiremos seguros. Mas de que vale a vida sem riscos da solidão, se uma das maiores tentações da existência é correr riscos? Ou será que o maior risco é o da solidão?
Confesso que me assombra a dúvida: a solidão como refúgio ou a vida em comum como guarida? O ideal talvez fosse saborear fortes doses de solidão na vida em comum ou permitir-se rápidas licenciosidades de convivência como lapsos da solidão.
Paulo Sant'Ana
Zero Hora 03/04/2005
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