sexta-feira, 23 de abril de 2010

Morrer em vida



Nunca esqueci de uma senhora que, ao responder por quanto tempo pretendia trabalhar, respondeu com toda a convicção: “Até os 100 anos”. O repórter, provocador, insistiu: “E depois?”. “Ué, depois vou aproveitar a vida”.

É de se comemorar que as pessoas aparentem ter menos idade do que realmente têm e que mantenham a vitalidade e o bom humor intactos – os dois grandes elixires da juventude. No entanto, cedo ou tarde (cada vez mais tarde, aleluia), envelheceremos todos. Não escondo que isso me amedronta um pouco. Ainda não cheguei perto da terceira idade, mas chegarei, e às vezes me angustio por antecipação com a dor inevitável de um dia ter que contrapor meu eu de dentro com meu eu de fora.

Rugas, tudo bem. Velhice não é isso, conheço gente enrugada que está saindo da faculdade. A velhice tem armadilhas bem mais elaboradas do que vincos em torno dos olhos. Ela pressupõe uma desaceleração gradativa: descer escadas de forma mais cautelosa, ser traída pela memória com mais regularidade, ter o corpo mais flácido, menos frescor nos gestos, os órgãos internos não respondendo com tanta presteza, o fôlego faltando por causa de uma ladeira à toa, ainda que isso nem sempre se cumpra: há muitos homens e mulheres que além de um ótimo aspecto, mantêm uma saúde de pugilista. A comparação com os pugilistas não é de todo absurda: é de briga mesmo que estamos falando. A briga contra o olhar do outro.

Muitos se queixam da pior das invisibilidades: “Não me olham mais com desejo”. Ouvi uma mulher belíssima dizer isso num programa de tevê, e eu pensei: não pode ser por causa da embalagem, que é tão charmosa. Deve estar lhe faltando ousadia, agilidade de pensamento, a mesma gana de viver que tinha aos 30 ou 40. Ela deve estar se boicotando de alguma forma, porque só cuidar da embalagem não adianta, o produto interno é que precisa seguir na validade.
uma linda e jovem aluna (Penélope Cruz) e passa a ter com ela um envolvimento que lhe serve como tubo de oxigênio e ao mesmo tempo o faz confrontar-se com a própria finitude. No livro que deu origem ao filme (O Animal Agonizante, de Philip Roth), há uma frase que resume essa comovente ansiedade de vida: “Nada se aquieta, por mais que a gente envelheça”.

Essa é a ardileza da passagem do tempo: ela não te sossega por dentro da mesma forma que te desgasta por fora. O corpo decai com mais ligeireza que o espírito, que, ao contrário, costuma rejuvenescer quando a maturidade se estabelece.

Como compensar as perdas inevitáveis que a idade traz? Usando a cabeça: em vez de lutarmos para não envelhecer, devemos lutar para não emburrecer. Seguir trabalhando, viajando, lendo, se relacionando, se interessando e se renovando. Porque se emburrecermos, aí sim, não restará mais nada.
Martha Medeiros

7 comentários:

  1. Silvia, a sua matéria de hoje está muito interessante, seu blog com muita classe, e você, bem... muito linda.

    Beijão de final de semana, ZC

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  2. A idade esta em cada coração, as pessoas ainda vivem de aparência, mas no fundo cada um precisa se apegar a alguma coisa, grande beijo Lisette.

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  3. Bom dia, amiga.
    Quando eu era jovem, nunca me imaginei velha.
    Pensava que não chegaria viva até os dias de hoje.
    De uma coisa, tenha a certeza: a juventude dura muito tempo. Demora-se muito, para o envelhecimento chegar. Faça planos, coloque-os em prática, seja feliz!

    Um grande abraço.

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  4. Anônimo27/4/10

    Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Anônimo28/4/10

    Silvia querida, excluí meu comentário pq continha um engano referente a autoria. Dei-me conta do "pecado", mas em nada modificou minha opinião que continua a mesma, tanto que editei meu comment e agora reproduzo: "... Gostei mesmo. É dificil a gente achar aqui na blogosfera algo que fale com seriedade sobre a velhice. Nesses blogs que abordam esse tema o que se vê são aquelas baboseiras de "melhor idade". Um besteirol recheado de preconceitos. Estou preparando um post sobre esse assunto porque realmente abomino preconceitos, quaisquer que sejam, e esse da velhice, é mortal! Honestamente, quem é que quer ficar velho? Todo mundo quer vida longa, mas ficar velho? Encarar a velhice? E depois vem esses textos com essa bobagem de melhor idade? Eu hein. E geralmente quem escreve sobre isso ainda não chegou a essa idade, portanto, nem sabe o que é. Parabéns, amiga, tu és bem jovem, mas tens uma percepção apurada e despida de preconceitos, deu pra notar pela escolha do texto. Otimo post. Beijo grande.

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  6. Marli, eu que peço desculpas pois havia esquecido de colocar na postagem a autora. DE qualquer modo, posso dizer que, embora não tenha o dom de escrever, sempre seleciono textos que refletem meu pensamento, também.
    Abraço e obrigada

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